“um livro de poemas / serve para sonegar cicatrizes?”
Edição: Vitor Diel
Arte: Giovani Urio sobre reprodução
Tu já sabias…
todos os meus romances
terminam em poesias.
(p.82)
um livro de poemas
serve para perder-se em sonhos e sono?
à toa, todavia tentando transcender
e entre representatividades entreter.
a qual caminho me conformo?
a algo literário? insólito dilema
(em) um livro de poemas
tem tradução de texto que enfatize
o que já sabemos de semântica
ao dominar, me dizem,
— respondendo-me em rima romântica —
levas de léxicos e lexemas?
um livro de poemas
se conta em quantas quatrocentas querelas?
restará uma resma para roçar
com uma caneta e contar,
mencionar muitas mazelas
preparadas previamente as penas?
um livro de poemas
me comove a querer continuar
a ler literatura que lidera a lente
com que construo concomitantemente
um obtuso analisar
de materialidades em fonemas
um livro de poemas
põe em poesia a perceção das paragens?
esconde locais escabrosos?
verticaliza-se por viagens?
ou não é mais que símbolos melindrosos
içando-se acima dos sistemas?
um livro de poemas
serve para sonegar cicatrizes?
ou, embora elabore brechas
estimula a que expies
a fogo e ferro a ferida que fecha?
há coletânea de mais clássico esquema
(que) um livro de poemas?
que escreve acentuando estações
que consegue combinar concretude
de sentimentos de solidão e solitude
pensando perseverar em paixões…
há contenda mais extrema
(que) um livro de poemas?
tentando tratar menos de estratagemas
não é senão a sina de ser ciente
preenchendo de potente precisão
algo que, de tão excelente,
é sem explicação?
Dorme, poema
Deita teus versos pífios no lençol branco do papel.
Silencia a rima,
cala a fragilidade encardida de dor,
livra-te da métrica que não deixa ousar.
Tu, que não nasceste conto, crônica ou novela.
Tu, que não podes ser traduzido por nenhuma língua estrangeira.
Tu, que expressas muito sem fazer sentido de nada.
Dorme,
dorme,
dorme.
E acorda enorme.
(p.14)
Sobre a autora
Carolina é redatora publicitária e professora de inglês. Já foi bailarina e atriz. Natural de Porto Alegre, aos 10 anos mudou-se pra Criciúma, em Santa Catarina. Após algumas aventuras pelo mundo, sossegou na capital gaúcha. Em duas ocasiões foi contemplada com o primeiro lugar em concursos culturais promovidos pela Editora Abril e pelo jornal Zero Hora. Os feitos resultaram em viagens para Grécia e Inglaterra. Eventualmente colabora com revistas virtuais. Língua-mãe é seu primeiro livro individual.

Língua-mãe
Carolina Meyer Silvestre
104 p.
R$ 33
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Maiara Alvarez é bacharel em Jornalismo e especialista em Leitura e Produção Textual. Conta histórias desde que aprendeu a repeti-las de forma oral. Foi criança que inventou palavras. Jovem, notou que poderia criar algo maior. Trabalhou no terceiro setor, participando de eventos literários e escrevendo projetos, um deles premiado nacionalmente. Escreve, edita e fotografa. Atua com revisão desde 2011, com jornais, relatórios, produções acadêmicas e ficção, e hoje ministra uma oficina na área.
Foto: Acervo pessoal
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