A hora do microconto

Doralino Souza explora o potencial das narrativas (super) curtas em livro novo

Edição: Vitor Diel sobre texto da assessoria
Arte: Giovani Urio sobre divulgação

Com o título de Enquanto espero o troco do café, o novo livro de Doralino Souza é a incursão do autor na chamada microliteratura, que consiste em minicontos, microcontos e nanocontos — histórias contadas em 30, 50, 100 ou 150 palavras. De acordo com o autor, nesse livro os leitores encontrarão 70 narrativas que passeiam pelas mais diversas situações. “Histórias aparentemente curtas, mas carregadas de significados, de narratividade, de olhar sobre a condição humana, pois minha matéria prima é a vida real, com tudo o que ela apresenta de ridículo, patético, grandioso, maravilhoso”, relata. “É um desafio autoimposto pelos escritores, criar um enredo que apresente o máximo de narratividade e efeito com o mínimo de palavras. É como disse Júlio Cortázar, se o romance vence por pontos, o conto vence por nocaute. Então, eu me esforcei para, nesse livro, dar 70 pequenos nocautes no leitor”, completa.

O livro é a quarta publicação de Doralino, que já foi duas vezes finalista ao Prêmio AGES Livro do Ano.

Sobre a obra, Mário Baggio escreve na orelha: “São histórias que prescindem de descrições ou pormenorizações desnecessárias para que o leitor ‘entre no clima’ e se deleite. É assim que o microconto, esse gênero literário tão cultuado nas últimas décadas (muito em função das redes sociais e da velocidade dos nossos dias), conquista e surpreende. Hemingway, o grande escritor norte-americano da primeira metade do século passado, que o diga. O leitor não precisa de mais palavras para entender e se comover com ‘Vende-se: sapatinhos de bebê nunca usados’. Transmitir emoções com um mínimo de palavras é um desafio e tanto para o escritor”.

O lançamento de Enquanto espero o troco do café ocorre no dia 27 de abril, a partir das 19h30, no Sobrinhos Rock Bar (Rua Independência, 639 – Centro – Igrejinha/RS). Confira abaixo quatro contos presentes na obra:

O MONSTRO

Às vezes, quando mamãe sai pro trabalho, o monstro vem. Fico quietinha pra ver se ele vai embora. Que nada. Continua ali, daquele jeito. A respiração. Os cheiros. Sussurra meu nome, pega meus cabelos, começa fazer coisas. E dói. Eu queria ter a coragem da mamãe. Ela dorme a noite toda com o monstro.

A INICIAÇÃO

Ou faço isso, ou serei chamado de maricas pela turma. Lourenço e Betão me olham. Mantenho o porrete erguido e na posição. Os dois seguram firme o saco de linho enquanto a criatura, lá dentro, se remexe querendo escapar. Tudo bem, só dez pauladas, penso comigo. Acerto a primeira com toda força.

CORRENTE NO ESCRITÓRIO

Fabiana abraçou Camila, que deu três beijos em Carlos, que cumprimentou Artur, que sussurrou no ouvido de Neusa, que confidenciou para Lurdes, que dividiu um cigarro com Andreia, que beijou na boca de Emerson, que fez amor com Joaquim, que não era do escritório e tinha consulta médica agendada para a manhã seguinte. Foi entubado dias depois.

PARA TI, MEU AMOR, UM DRINK

Evandra fitou o homem ao seu lado, deitado, de bruços, sobre a toalha de praia. O sol parecia cansado e a areia não refletia calor. Evandra estava impressionada com a rapidez do efeito. “Foi beber e apagar, quem diria.” Ela esperou algum tempo, olhando pro mar, em seguida, se levantou, jogou fora o resto da bebida, que trazia na coqueteleira, depois, fazendo cara de assustada, gesticulou pedindo ajuda ao salva-vidas.

Sobre o autor
Doralino Souza nasceu em São Francisco de Paula/RS, em novembro de 1969. Publicou os livros Dentes no copo de uísque & outros contos de crime (2019, Editora JM2D), O Cânion de dentro (2016, editora JM2D) finalista ao Prêmio AGES Livro do ano na categoria Infanto-juvenil, e Anjos também usam boné (2014, Editora JM2D) Finalista ao Prêmio AGES Livro do ano na categoria contos. Foi vencedor do I Premio Internacional de Microcontos. Possui diversas publicações em antologias, incluindo o Premio Off Flip 2022 (de Paraty), contribui com jornais e revistas impressos e digitais. Idealizador e editor da Revista Paranhana Literário e Repórter da Radioweb Arteviva. É jornalista, educador social e ativista cultural.

Enquanto espero o troco do café
Doralino Souza
88 p.
Editora Bestiário
R$ 35
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